29 março 2023

A dupla face de Marília

Texto de Laura Pinto apresentado ao PNED - Concurso Literário «A Ética na Vida e no Desporto»

Marília era uma jovem apaixonada pela equitação. Treinava diariamente,  horas a fio, montada no seu cavalo, o Osíris. A sua relação não se limitava ao  ato de subir para o dorso do cavalo. A arte equestre é muito mais complexa.  Implica uma relação sincera, de confiança e amizade entre o cavaleiro e o  cavalo. Marília e Osíris eram inseparáveis… Em dupla faziam magia. Os olhos  da cavaleira irradiavam felicidade em cima de Osíris enquanto os saltos do  cavalo retratavam o estado de espírito de Marília.  

As primeiras provas foram um sucesso. Foi o estímulo necessário para  subir a fasquia. Nas provas seguintes o objetivo foi melhorar o desempenho  anterior. Marília e Osíris eram as estrelas maiores das provas regionais em que  participavam. Para eles o céu era o limite… até um dia! 

A participação em provas nacionais demonstrou que ainda tinham um  longo percurso a percorrer. As suas extraordinárias prestações perdiam-se num  contexto competitivo tremendo… Todo o investimento em equipamentos e horas  de treino pareciam escassos para atingir a marca que lhes permitiria o acesso  aos ambicionados Jogos Olímpicos. A alegria deu lugar à desilusão e à tristeza…  seguiram-se as lesões e aumentaram-se as frustrações. O desejo de um  resultado positivo cegou Marília. A probabilidade de vencer aumentava quanto  mais provas participasse. Isto impedia que Osíris recuperasse das suas lesões  de forma adequada. Todas as indicações médicas eram ignoradas. O sucesso  individual era o mais importante. Não importava o custo ou o risco. Por este  motivo Marília decidiu começar a sobredosar Osíris antes das provas. O cavalo  passou de fiel companheiro a um meio para atingir um fim. As cólicas que  desenvolvia eram combatidas com mais drogas. Sem que Marília se  apercebesse, a porta da eternidade do animal começava a abrir-se.. a eternidade  que não correspondia a glória… Até que um dia coube a Osíris submeter-se a  um controlo antidoping que lhe salvou a vida. Mas foi incapaz de retomar a  competição. A sua dona, que já não era amiga, tomou finalmente consciência do  que havia feito. Por esse motivo foi desclassificada. Mas a sua pena foi maior...  teve dificuldades em adquirir um novo animal junto dos criadores de cavalos. Um  verdadeiro apaixonado equestre é incapaz de vender um animal a quem os  maltrata. Esperou, desesperou por uma nova oportunidade. O seu calvário só  terminou quando conseguiu adquirir um novo potro, o Golden Strike. Tinha quatro anos. Conhecia-o desde a sua nascença. Fora criado por um vizinho seu,  já com alguma idade. Como não tinha condições para o criar cedeu-o a Marília. 

Consciente dos erros do passado, treinou afincadamente em busca do  sucesso, mas sem a pressão dos resultados. Passou a ter mais prazer, a  desfrutar do momento... dos momentos. E, de repente, tudo mudou. Não era a  cavaleira mais vitoriosa que desejara ser, mas era, certamente, a mais realizada  porque percebeu que nenhum prémio é tão valioso como a amizade de um  animal.


"Urgentemente" declamado por Leonor Lima

 


"Como se houvesse uma tempestade", declamado por Tiago Paliotes

 


28 março 2023

"Última canção" declamado por Gerson Pinto

 


O jogo, uma dádiva de Deus

Texto de Rui Silva apresentado ao PNED - Concurso Literário «A Ética na Vida e no Desporto»

Nos finais de 1913 John era um jovem de Manchester que sonhava ser jogador  profissional de futebol. A sua realidade era, porém, bem diferente. Trabalhava horas  a fio numa das muitas fábricas têxteis da sua região. A hora de entrada era sempre a  mesma: 5h da manhã. Já a hora de saída... variava de acordo com a vontade e as  necessidades do patrão. Nos fins-de-semana tocava, ainda que de forma efémera,  no seu sonho. Era quando jogava no campeonato amador mais anónimo. Apesar de  tudo era feliz... As derrotas e as vitórias eram sempre comemoradas. Festejava-se  sempre da mesma forma e no mesmo local: o pub mais frequentado da cidade.  

De repente tudo se desmoronou.... John é convocado pelo exército inglês para a  combater na I Guerra Mundial. Continuou, deste forma, a lutar pelo mesmo desígnio:  a vitória coletiva. Tudo resto era diferente. A sua vida e os seus sonhos pouco  interessavam... o campo, que era da bola, deixou de ter linhas. A bola deu lugar às  armas e o alvo passou a ser o “jogador” adversário em vez da sua baliza. O prazer  de jogar deu lugar ao desejo de sobreviver. O período que se seguiu foi penoso. Dia  após dia, vários dos seus colegas foram expulsos do jogo da vida. O facto de não  existir um árbitro que assegurasse o verdadeiro espírito do jogo e de os dirigentes  políticos estarem sempre a recompor as suas equipas com novos elementos impediu que este fosse dado por terminado logo às primeiras entradas fora da lei. O jogo  parecia eterno...  

A dado momento uma pequena pausa. Nas modalidades de pavilhão estes  momentos são definidos como “Pausa Técnica” ou “Tempo Morto”. Para John foi o  tempo para perceber que ele e os restantes jogadores estavam vivos, bem vivos.  Aproveitando as “Tréguas de Natal” que haviam sido decretadas, John tirou dos seus 

pertences a sua melhor amiga: a bola. Após sair da trincheira deu, a medo, os seus  primeiros toques na companhia dos colegas de equipa. O campo, improvisado, foi  repentinamente coberto de panos brancos. O que parecia ser a claque organizada  dos “Ultra Peace” era apenas um conjunto de jovens alemães a demonstrar que  partilhavam os mesmos ideais: a paixão pelo jogo e pela vida. John fora, por instantes,  transportado para um dos seus saudosos fins-de-semana. De repente deixara de lutar  “contra” para “jogar” com os alemães. É este o verdadeiro espírito do jogo...


"Há dias", declamado por Maria Fernandes

 


All4Integrity - Encerramento das atividades 2023-24

  Decorreu ontem, dia 3 de junho, numa plataforma online, a  edição da cerimónia final que esteve focada na partilha de experiências entre a...