01 abril 2023

Entrevista com... Profª Teresa Casquilho Ribeiro

No mês em que se invoca mais um aniversário da Revolução dos Cravos a nossa aluna Laura Pinto (LP) irá apresentar um conjunto de entrevistas que refletem sobre o tema da Corrupção em Portugal.

Iniciamos esta iniciativa com uma docente da EPDRAC que se aposentou no mês passado. Teresa Casquilho Ribeiro (TCR), começou a lecionar no Ensino Básico em 1975. Esteve ligada ao Ensino Profissional, na EPDRAC, desde 1993. Aqui exerceu, entre outras, as funções de Professora Bibliotecária de 2015 a 2020.

Terminou o mestrado em História Moderna em 1996, na Universidade de Coimbra, com a tese: O Município de Alter do Chão nos finais do séc. XVIII, rostos do poder concelhio. Esta obra foi publicada pela Palimage Editores.


LP - Qual a origem da corrupção?

TCR - A corrupção acompanhou o Homem ao longo de toda a História, é quase tão velha como as relações humanas. Imagino os caçadores da pré-História a guardar as melhores peças de caça ou as peles mais bonitas para os membros mais influentes e poderosos do grupo, em troca de um benefício.

Com o tempo ter-se-á tornado mais sofisticada e mais poderosa. Ajudou a criar impérios, assim como ajudou a derrubá-los. E chegou até hoje. Falar sobre corrupção dava para escrever um romance. Que podia ser de terror... 

 

LP - Mas existe a perceção de que não existia corrupção no Estado Novo…

TCR - Ela existiu, só não tínhamos, como agora, a perceção desse problema. As prioridades eram outras. As primeiras alterações à Paz Social que vivi foram as da crise estudantil de 1969.  Vi como um grupo de amigos se dividiu porque uns furaram a greve aos exames e outros não.  Por isso, houve represálias. Eram tempos em que a sociedade Coimbrã fervilhava. De corrupção não se falou. Quando aconteceu a Revolução do 25 de Abril eu tinha 21 anos.  Nada me preocupava… muitos menos os temas "Política" (o que era isso?) ou "Corrupção". Foi com o avançar da Era Democrática e da liberdade de imprensa que o termo "corrupção" entrou no vocabulário normal, até se banalizar...

 

LP - A que se deve a realidade atual?

TCR - A existência de leis brandas e de uma justiça lenta, que arrasta processos judiciais ao longos dos anos, tem contribuído para o crescimento na população de uma ideia de impunidade em relação aos prevaricadores que, muitas das vezes, até são figuras públicas. Como estes são exemplos para a sociedade, transformam-se em maus exemplos. Esta realidade acaba por se traduzir no alastramento do fenómeno, devido à liberdade de imprensa e através da comunicação social que, na ânsia de aumentar audiências, noticia tudo o que é escândalo até à exaustão, "dando ideias" a cabeças mais fracas ou mais gananciosas.

 

LP - Então como podemos acabar com a corrupção?

TCR - Penso que podemos assistir à queda do número de crimes atualmente verificados se a justiça for mais célere, mais dura e os cidadãos virem as penas a ser efetivamente aplicadas. Acabar com a corrupção? Ela é tão velha como as relações humanas.

29 março 2023

A dupla face de Marília

Texto de Laura Pinto apresentado ao PNED - Concurso Literário «A Ética na Vida e no Desporto»

Marília era uma jovem apaixonada pela equitação. Treinava diariamente,  horas a fio, montada no seu cavalo, o Osíris. A sua relação não se limitava ao  ato de subir para o dorso do cavalo. A arte equestre é muito mais complexa.  Implica uma relação sincera, de confiança e amizade entre o cavaleiro e o  cavalo. Marília e Osíris eram inseparáveis… Em dupla faziam magia. Os olhos  da cavaleira irradiavam felicidade em cima de Osíris enquanto os saltos do  cavalo retratavam o estado de espírito de Marília.  

As primeiras provas foram um sucesso. Foi o estímulo necessário para  subir a fasquia. Nas provas seguintes o objetivo foi melhorar o desempenho  anterior. Marília e Osíris eram as estrelas maiores das provas regionais em que  participavam. Para eles o céu era o limite… até um dia! 

A participação em provas nacionais demonstrou que ainda tinham um  longo percurso a percorrer. As suas extraordinárias prestações perdiam-se num  contexto competitivo tremendo… Todo o investimento em equipamentos e horas  de treino pareciam escassos para atingir a marca que lhes permitiria o acesso  aos ambicionados Jogos Olímpicos. A alegria deu lugar à desilusão e à tristeza…  seguiram-se as lesões e aumentaram-se as frustrações. O desejo de um  resultado positivo cegou Marília. A probabilidade de vencer aumentava quanto  mais provas participasse. Isto impedia que Osíris recuperasse das suas lesões  de forma adequada. Todas as indicações médicas eram ignoradas. O sucesso  individual era o mais importante. Não importava o custo ou o risco. Por este  motivo Marília decidiu começar a sobredosar Osíris antes das provas. O cavalo  passou de fiel companheiro a um meio para atingir um fim. As cólicas que  desenvolvia eram combatidas com mais drogas. Sem que Marília se  apercebesse, a porta da eternidade do animal começava a abrir-se.. a eternidade  que não correspondia a glória… Até que um dia coube a Osíris submeter-se a  um controlo antidoping que lhe salvou a vida. Mas foi incapaz de retomar a  competição. A sua dona, que já não era amiga, tomou finalmente consciência do  que havia feito. Por esse motivo foi desclassificada. Mas a sua pena foi maior...  teve dificuldades em adquirir um novo animal junto dos criadores de cavalos. Um  verdadeiro apaixonado equestre é incapaz de vender um animal a quem os  maltrata. Esperou, desesperou por uma nova oportunidade. O seu calvário só  terminou quando conseguiu adquirir um novo potro, o Golden Strike. Tinha quatro anos. Conhecia-o desde a sua nascença. Fora criado por um vizinho seu,  já com alguma idade. Como não tinha condições para o criar cedeu-o a Marília. 

Consciente dos erros do passado, treinou afincadamente em busca do  sucesso, mas sem a pressão dos resultados. Passou a ter mais prazer, a  desfrutar do momento... dos momentos. E, de repente, tudo mudou. Não era a  cavaleira mais vitoriosa que desejara ser, mas era, certamente, a mais realizada  porque percebeu que nenhum prémio é tão valioso como a amizade de um  animal.


"Urgentemente" declamado por Leonor Lima

 


"Como se houvesse uma tempestade", declamado por Tiago Paliotes

 


Palavras&Cª. Abril de 2024